O Brasil começa a dar os primeiros passos em uma ambiciosa estratégia internacional de combate à dengue: a introdução na natureza de exemplares do mosquito transmissor, o Aedes aegypti, imunes à doença.

A iniciativa, capitaneada pela Fiocruz, (Fundação Oswaldo Cruz), foi anunciada anteontem no Congresso Internacional de Medicina Tropical, no Rio de Janeiro.

O trabalho está em fase de testes iniciais e, se tudo der certo, os primeiros aedes “vacinados” contra a dengue devem ganhar as ruas do país em estudos controlados no segundo semestre de 2014.

Ainda não se sabe em quais cidades o teste vai começar.

Em laboratório, cientistas contaminam os embriões do Aedes aegypti com uma variante da bactéria wolbachia, que é encontrada em cerca de 70% dos insetos na natureza, incluindo moscas-das-frutas e pernilongos “comuns”.

No organismo do mosquito, a bactéria impede o desenvolvimento do vírus da dengue, tornando-o imune.

“Os mecanismos que provocam isso são complexos, desde mudanças no sistema imune até a competição por nutrientes no interior das células”, diz Luciano Moreira, pesquisador da Fiocruz e chefe do projeto

Eliminar a Dengue: Desafio Brasil.

“O método é seguro. A bactéria já faz parte do dia a dia.

Não se “trata de uma alteração genética ou da introdução de um microrganismo novo.”

Uma vez introduzida na população de mosquitos, a bactéria consegue se espalhar com facilidade. Embora a contaminação seja só vertical (dos pais

para a prole), os mosquitinhos infectados têm mais sucesso na reprodução.

As fêmeas contaminadas têm descendentes com a bactéria independentemente de o macho estar infectado.

No caso das fêmeas que não apresentam o wolbachia, mas que copulam com machos com a bactéria, quase todos os ovos fecundados acabam morrendo.

Ou seja: fêmeas com a wolbachia produzem mais ovos, que vão originar novos mosquitos que já nascem com a bactéria e, portanto, imunes à dengue.
O método, criado na Austrália, já foi testado em duas cidades daquele país. A população de insetos foi substituída pela variante imune.

“Monitoramos essas áreas (da Austrália) e vimos que, até agora, 18 meses depois, elas continuam com praticamente 100% dos mosquitos com a bactéria”, diz Scott O’Neill, professor da Universidade Monash, em Melbourne, e um dos autores do trabalho australiano, publicado em 2011 na Nature.

Antes de começar os testes com o mosquito na natureza, os cientistas da Fiocruz vão fazer pequenas adaptações no método australiano.

“Os vírus que circulam nos dois países têm algumas diferenças. Isso precisa ser levado em consideração”, explica Luciano Moreira.

Imunização para humanos falha em estudos

A ampliação do uso dos mosquitos imunes à dengue é hoje uma das principais apostas no combate à doença, especialmente após o fraco desempenho dos últimos testes de uma vacina contra a doença, elaborada pelo laboratório Sanofi.

O desempenho dos testes clínicos da vacina foram publicados há duas semanas e mostraram que a imunização só teve eficácia de 30%.

O resultado foi considerado decepcionante, especialmente porque, em julho,

a farmacêutica havia anunciado que a vacina protegia contra três dos quatro sorotipos da dengue, sem mencionar o resultado total.Os estudos finais da imunização devem ser concluídos em 2015.

“A vacina e os mosquitos imunes são pesquisas importantes, mas não diminuem a importância de a população controlar os mosquitos sem deixar água parada”, diz Luciano Moreira, da Fiocruz

fonte: Folha Press

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